Seu corpo parecia ancorado a um peso invisível, os membros inertes como se algo tivesse drenado toda a sua energia. O som monótono e irritante de um bip constante preenchia o silêncio, ressoando em sua mente como um lembrete persistente de que ele ainda estava ali, vivo, mesmo que não soubesse se desejava estar.
Lewis abriu os olhos com dificuldade, as pálpebras pesadas, e os fechou quase imediatamente, apertando-os ao se deparar com a luz forte que invadia o cômodo. Por um momento, ele ficou imóvel, tentando reunir forças para abrir os olhos novamente. Quando finalmente conseguiu, o que viu o confundiu.
Tudo era branco.
As paredes, as cortinas que balançavam suavemente com o ar do condicionador de ar, os lençóis que cobriam seu corpo dolorido. Branco como um vazio, como uma tela onde sua mente ainda não conseguia pintar explicações para o que acontecera.
Ele franziu a testa, a confusão e o desconforto crescendo em seu peito, enquanto levantava o braço com esforço. Foi então que notou os fios finos ligados ao seu pulso. O som do monitor cardíaco ao lado de sua cama fazia coro ao bip que ouvia desde que acordara.
Antes que pudesse processar qualquer coisa, a porta se abriu.
— Lewis? Meu amor.
A voz soava com um tom de urgência e alívio entrelaçados. Sua mãe, Samanta, entrou no quarto com passos apressados, carregando uma xícara de chá que foi rapidamente colocada sobre a cômoda ao lado. Ela não hesitou antes de envolvê-lo em um abraço cuidadoso, como se temesse machucá-lo ainda mais.
— Finalmente acordou,— ela murmurou, a voz embargada por uma emoção que Lewis conhecia bem demais: preocupação.
Por um momento, ele permaneceu ali, em silêncio, preso no calor familiar do abraço de sua mãe. Mas a tranquilidade não durou. A memória da agressão invadiu sua mente como uma tempestade, violenta e avassaladora, cada detalhe vindo à tona de uma só vez. O choque, os gritos, a dor, o chão frio contra seu rosto…
Lewis piscou repetidamente, tentando afastar as imagens, mas seus olhos logo ficaram marejados. Os soluços vieram antes que ele pudesse contê-los, e Samanta, sentindo a mudança, afastou-se apenas o suficiente para encará-lo com preocupação.
— Oh, meu amor, meu bebê…— A mulher o envolveu novamente, desta vez com mais firmeza, como se quisesse protegê-lo de qualquer mal que ousasse se aproximar outra vez.
Lewis não conseguiu segurar. Sua mão foi instintivamente até a cintura da mãe, apertando o tecido do vestido com força entre os dedos, enquanto seu corpo se dobrava em soluços altos. Os ombros dele sacudiam a cada respiração entrecortada, o peso da dor que carregava finalmente encontrando uma válvula de escape.
Samanta lutava para manter a calma, mas sua própria voz tremia ao tentar consolá-lo. — Meu Deus, o que aconteceu, querido? Quem fez isso com você, meu bem?
Sua pergunta ficou no ar, uma mistura de desespero e culpa. Ela sentia como se tivesse falhado com ele, como se a responsabilidade de protegê-lo tivesse sido arrancada de suas mãos. Sua mente a levou de volta ao momento em que o encontrara, caído no chão do quarto, o rosto coberto de sangue e o corpo tão machucado que parecia irreconhecível.
Ela mal conseguiu pensar naquela hora. Seu instinto de mãe a fez gritar por ajuda, e o marido correu para ajudá-la a carregar o filho até o carro. O caminho até o hospital foi um borrão de angústia e súplicas silenciosas para que ele sobrevivesse.
— Está tudo bem agora,— ela disse, com ternura, enquanto beijava os cabelos de Lewis e acariciava seus fios macios. — Eu estou aqui, hm? Estou aqui, meu amor. Nada mais vai te machucar.
Ela continuou falando, repetindo palavras de consolo e distribuindo beijos suaves em sua cabeça, até que os soluços de Lewis diminuíram gradualmente. Ainda que os olhos permanecessem inchados e vermelhos, sua respiração pesada agora estava mais controlada.
Samanta afastou-se apenas o suficiente para encarar o rosto do filho, a mão dela encontrando o caminho até as bochechas marcadas por hematomas. Com um toque quase reverente, ela deslizou os dedos pelo rosto dele, como se quisesse apagar cada vestígio de dor.
— Você pode me contar agora o que aconteceu, querido? — perguntou suavemente, seu olhar cheio de amor e preocupação. — Por favor, me conte a verdade. Não se preocupe com nada, meu amor. Eu estou aqui para você.
Depois de um breve silêncio, ela suspirou. — Você pode me contar agora o que aconteceu, querido? Por favor, me diga a verdade, sim? — Sua voz soava paciente, mas havia um desespero sutil por trás das palavras. — Não se preocupe com nada, querido. Eu estou aqui.
Lewis engoliu em seco, sentindo sua garganta arranhar. O peso do olhar de sua mãe era sufocante. Ele queria contar tudo, queria despejar a verdade e arrancar aquilo de dentro de si como se pudesse expurgar sua dor. Mas ele não podia.
Ele continuou observando o rosto de sua mãe. O pálido tom de sua pele, as olheiras escuras que denunciavam noites em claro, a preocupação evidente em cada linha de seu rosto. E tudo isso era sua culpa.
Lewis queria chorar novamente.
Ele queria tanto falar a verdade. Mas ele já tinha sofrido o suficiente para aprender a nunca duvidar de nenhuma ameaça de Edward. Nunca. Lewis não era burro, não colocaria Edward à prova.
— E-eu…— Sua voz saiu fraca e áspera. Assim que tentou falar, uma tosse forte sacudiu seu peito, sua garganta protestando contra o esforço.
Samanta rapidamente pegou o copo de água sobre a cômoda e o ajudou a beber. Lewis aceitou de bom grado, sentindo a água fria aliviar, ainda que levemente, a secura em sua boca.
Foi nesse momento que a porta do quarto se abriu novamente, revelando a figura de Daniel. O homem ficou imóvel por um instante, como se precisasse confirmar que o filho realmente estava acordado, antes de se aproximar com passos rápidos.
— Você está acordado, graças a Deus, querido. — Daniel murmurou, a voz embargada de alívio.
Lewis apenas assentiu levemente, sentindo os dedos do mais velho afagarem seus cabelos com cuidado.
— Amor,— Samanta chamou a atenção do marido. — Lewis ia começar a contar como isso aconteceu. — Ela colocou o copo de volta ao lado da jarra com água e voltou seu olhar ansioso para o filho.
— Ótimo,— Daniel respondeu com um tom determinado. — Eu já estava prestes a chamar a polícia.
A menção à polícia fez o coração de Lewis acelerar. Ele sentiu o sangue esvair-se de seu rosto, um pavor absoluto tomando conta de si.
Polícia? Não, não!
— E-Era para ser um assalto, — Lewis começou a falar rapidamente, sua mente desesperada buscando uma desculpa plausível. Ele apertou as mãos sob o lençol, tentando esconder sua tremedeira. — Eu acho… — Sua voz ainda estava rouca, mas ele se forçou a continuar. — Eu fui ao parque mais cedo e, quando estava voltando, fui abordado por dois caras. Eles me revistaram, mas quando perceberam que eu não tinha nada de valor, um deles começou a me bater e gritar. — Ele fez uma pausa, inspirando profundamente. — Eu consegui fugir quando um carro passou perto do beco e cheguei em casa, mas não tinha ninguém… então só tentei subir para o meu quarto. Só lembro de cair no chão e apagar.
Lewis sentiu um arrepio percorrer sua espinha com a naturalidade com que contou a mentira. Ele nunca havia sido bom em enganar ninguém, mas a urgência e o medo dentro de si o obrigaram a se tornar convincente.
Samanta imediatamente o abraçou de novo, envolvendo-o com um calor protetor. Ele se permitiu relaxar por um breve segundo, deixando uma única lágrima rolar por sua bochecha.
— Droga,— Daniel resmungou, passando a mão pelos cabelos em frustração. — Você viu o rosto deles?
Lewis negou com a cabeça. — Estavam mascarados.
O mais velho soltou um suspiro pesado, pegando seu celular. — Tudo bem, tudo bem. Seja como for, vamos encontrar esses desgraçados.
A respiração de Lewis travou. Ele afastou-se ligeiramente da mãe, seu coração batendo forte contra suas costelas. — Por favor, não façam isso.
Os dois adultos o encararam, confusos.
— Eu não quero ter que passar por isso, mãe. Só quero voltar para casa e esquecer esse dia. Por favor. — Seu tom era suplicante, seus olhos imploravam.
— Mas querido, — Samanta murmurou, hesitante. — Eles precisam ser pegos e pagar pelo que fizeram. Olha só como deixaram você.
— Mas eu nem lembro deles, — ele insistiu, sua voz um pouco mais firme. — E estávamos num beco. Não daria em nada, apenas me farão reviver e reviver sem parar o que aconteceu. — Ele olhou para Daniel. — Por favor, pai, vamos apenas esquecer tudo isso.
Daniel permaneceu imóvel, o celular ainda em sua mão. Por um instante ele se perdeu comovido por Lewis ter lhe chamado de pai. Isso nunca acontecia. Então se viu com o coração mais apertado e inclinado pra fazer tudo que ele pedisse. Seus olhos alternaram entre Lewis e sua esposa.
Samanta observou o filho, percebendo o quão cansado e abalado ele parecia. Seus olhos estavam cheios de medo.
— Você tem certeza, amor? — Ela acariciou sua bochecha com cuidado.
Lewis assentiu.
Samanta suspirou, trocando um olhar com o marido antes de finalmente murmurar encolhendo os ombros: — Vamos apenas esquecer e superar juntos.
Daniel hesitou por um instante, mas por fim, assentiu. Ele guardou o celular no bolso e puxou uma cadeira para sentar-se ao lado do filho, segurando sua mão entre as suas. — Está bem.
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— Edward, venha aqui num instante. — Daniel chamou assim que entrou em casa.
Ele havia deixado Lewis no hospital com Samanta para cuidar de alguns trabalhos, mas também precisava conversar com o filho.
— Eu vou tomar banho. — Edward respondeu sem interesse, já subindo a escada.
— Eu quero falar com você, Edward. Agora. — O tom de Daniel foi sério, inegociável.
Edward revirou os olhos, passando a mão pelos cabelos, mas voltou e seguiu o pai até o escritório.
— Onde você estava? — Daniel perguntou assim que fechou a porta.
Edward deu de ombros. — Com uns amigos.
— Uns amigos? — Daniel o olhou com incredulidade. — Lewis chegou em casa todo machucado e precisando de ajuda, e você, que deveria estar aqui com ele, estava com uns ‘amigos’?
Edward franziu o cenho por um instante, mas logo desfez qualquer reação.
— Eu não sou babá dele, — respondeu friamente. — Não sou obrigado a ficar com ele.
— Edward, o Lewis foi atacado por marginais! Brutalmente espancado!
Edward manteve seu olhar vazio, impenetrável. — E daí?
Daniel sentiu um arrepio de indignação.
Sem dizer mais nada, Edward saiu da sala sem se importar de fechar a porta e subiu pro seu quarto.
Daniel continuava perplexo, seu olhar na porta. Como o próprio filho podia ser tão insensível? Mas então, algo ecoou em sua mente.
Ele lembrou das mãos de Edward. As juntas machucadas. Como se ele tivesse socado algo.
Ou alguém