Samanta se levantou abruptamente, apontando para a porta com o rosto contorcido de raiva.
— Saia da minha casa. — Disse entre dentes, sua voz carregada de indignação.
— Senhorita Smith—
— Saia da minha casa agora! — Ela gritou, seu peito subindo e descendo com a respiração acelerada.
A detetive se levantou, mantendo a compostura.
— Se acalme. — Disse num tom neutro, tentando evitar uma escalada da situação.
— Que porra você está insinuando?! — A voz de Samanta tremeu de fúria, seus punhos cerrados ao lado do corpo.
— Nós só estamos tentando entender algumas coisas. — A detetive respondeu, sua calma irritante apenas aumentando a frustração de Samanta.
Ela tremia de raiva, o ar saindo pesado de seus pulmões.
Samanta estava furiosa com as perguntas que os detetives começaram a fazer sobre Daniel. Perguntas como, se Daniel já havia machucado Lewis alguma vez, ou se já houve algum incidente em casa.
Samanta não era burra, ela sabia onde aquilo estava indo e imediatamente interrompeu a conversa, sentindo-se enjoada com as ideias que os dois estavam tendo sobre seu marido.
O toque repentino da campainha interrompeu o clima pesado. Samanta fechou os olhos por um instante, tentando se recompor antes de se dirigir à porta. Apertou os punhos e inspirou fundo antes de girar a maçaneta.
Daniel entrou com a expressão tranquila, sem perceber a tensão no ar. Ao ver a esposa, sorriu e lhe deu um beijo leve, antes de perguntar casualmente pelos meninos.
— Eu ia contar para você assim que chegasse do trabalho. — A voz de Samanta vacilou.
Daniel franziu a testa, observando-a com atenção enquanto tirava o casaco.
— Senhor Smitht? — A voz de um dos detetives chamou sua atenção.
Daniel parou no meio do movimento de soltar a gravata, seus olhos indo de Samanta para os dois estranhos na sala.
— Quem são? — Perguntou, seu tom ficando mais sério.
— O senhor precisa nos acompanhar até a delegacia. — Detetive Parker mostrou sua identificação, seguido pelo parceiro.
O cenho de Daniel se franziu ainda mais. A despreocupação inicial deu lugar a um olhar de alerta.
— O que aconteceu? Edward está bem? — Ele se virou para Samanta, buscando respostas.
Ela apenas assentiu com a cabeça, tentando acalmá-lo.
— Não é sobre Edward, senhor. — A detetive interveio. — É sobre o Lewis.
O corpo de Daniel enrijeceu.
— O que aconteceu com o Lewis?! — A preocupação transpareceu em sua voz, seu olhar indo até Samanta em busca de uma explicação.
Ela segurou o braço dele com delicadeza, tentando transmitir alguma calma.
— Calma, amor. Lewis está bem. Foi apenas um acidente. Mas esses dois… — Ela pausou, tentando controlar a irritação. Inspirou fundo antes de continuar, sua voz carregada de desprezo. — Não querem entender isso. — Finalizou, lançando um olhar duro para os detetives.
Daniel piscou, confuso.
— Eu não estou entendendo.
— Nós iremos explicar melhor na delegacia, mas o senhor precisa nos acompanhar. — A detetive afirmou, mantendo seu tom profissional.
— Eu não vou a lugar nenhum sem antes entender o que está acontecendo. Eu não sou idiota e conheço muito bem os meus direitos. Quero saber por que deveria acompanhá-los se meus filhos estão bem.
A detetive suspirou pesadamente, levando a mão à ponta do nariz, coçando-a levemente antes de encarar Daniel novamente.
— Lewis pode ter sido vítima de abuso sexual, e o senhor é um suspeito. — Detetive Jack disse de uma vez, sem rodeios.
O impacto daquelas palavras atingiu Daniel como um soco no estômago. Ele ficou paralisado por alguns segundos, sentindo o mundo girar ao seu redor. Seu peito apertou, e o ar parecia pesado demais para ser inspirado.
— O quê? — Sua voz saiu vacilante enquanto ele se virava para Samanta, buscando algum tipo de explicação. — O-o Lewis foi vítima do quê? — Seus lábios tremiam, sua mente recusando-se a processar aquela informação.
— Não é isso! — Samanta se desesperou, sua voz cheia de angústia. — Essas pessoas insistem nesse absurdo, mas não é verdade! O Lewis disse que foi um acidente, que se machucou nas escadas. É tudo um grande mal-entendido! — Ela insistiu, seus olhos marejados de raiva e desespero.
Daniel piscou várias vezes, tentando se concentrar.
— O-onde está o Lewis? Ele está bem? — Perguntou, olhando ao redor como se seu filho pudesse surgir a qualquer momento e esclarecer tudo.
— Lewis está no quarto agora, mas, repito, o senhor precisa vir conosco. — A detetive frisou novamente, mantendo seu tom profissional.
Daniel balançou a cabeça, ainda atordoado.
— Eu preciso ver o Lewis. — Daniel se moveu em direção as escadas.
— Isso se estendeu demais. — Detetive Jack murmurou antes que Daniel tentasse subir as escadas.
Num instante, o detetive agiu. Sua abordagem foi rápida e precisa, pegando Daniel de surpresa. Ele teve os braços imobilizados e, antes que pudesse reagir, foi prensado contra a parede. A dor da pressão contra seu peito misturou-se ao choque da situação. Enquanto seus pulsos eram algemados, o detetive começou a citar seus direitos.
— Que… porra! — Daniel murmurou, seu rosto ainda pressionado contra a parede.
— Pare! — Samanta gritou, sua voz carregada de pânico enquanto corria para tentar impedir a ação do detetive. Ela golpeou suas costas repetidamente, mas a outra mulher a segurou antes que pudesse fazer algo.
— Senhora, não dificulte mais o nosso trabalho. — A detetive advertiu com firmeza, afastando-a. — Seu marido não está sendo preso, apenas queremos esclarecer algumas dúvidas. Se acalme.
— Então por que vocês estão algemando ele?! — Samanta gritou, suas lágrimas escorrendo livremente.
— Precaução. — A resposta curta e direta da detetive não ofereceu nenhum alívio.
Samanta sentiu as pernas fraquejarem. Ela puxou o próprio cabelo em um gesto de frustração, a respiração ofegante.
— Isso não está acontecendo… — murmurou para si mesma, sua visão turva pelas lágrimas.
— Mãe? — Lewis apareceu no topo da escada, os olhos arregalados ao ver a cena diante dele.
Samanta virou-se rapidamente.
— Lewis, volta para o seu quarto agora! — Ela ordenou, seu tom era forte.
O menino, no entanto, ignorou a ordem e começou a descer as escadas, o pavor estampado em seu rosto.
— O que vocês estão fazendo?! — Lewis gritou ao ver o padrasto sendo puxado para fora. Sua respiração acelerou enquanto tentava alcançar Daniel.
A detetive manteve a porta aberta, observando enquanto o parceiro levava Daniel até a viatura.
— Não, por favor! Ele não fez nada! — Lewis protestou, sua voz embargada pelo choro.
A detetive virou-se para ele e tentou falar com suavidade.
— Você não precisa mais se preocupar, querido. Vamos resolver tudo, okay?
Lewis sentiu seu sangue ferver.
— A senhora não sabe de porra nenhuma! — Ele gritou, sua fúria e medo transbordando. Sua reação fez a detetive recuar por um instante antes de se recompor.
Para a detetive, era compreensível que Lewis estivesse aterrorizado. Talvez ele temesse represálias do agressor. Ela acreditava estar fazendo o certo. Prometeu a si mesma que protegeria o garoto e garantiria que o responsável por machucá-lo pagasse pelo que fez.
E naquele momento, segundo tudo o que ouviram até agora, o principal suspeito era Daniel.
Do lado de fora, Detetive Jack já estava dentro do veículo. Ele buzinou, indicando que estavam prontos para partir.
A Detetive Parker lançou um último olhar pesaroso para Lewis antes de seguir para o carro.
Lewis levou a mão à boca, tentando conter os soluços. A culpa pesava sobre seus ombros como uma corrente invisível e pesada, esmagando-o com a sensação de impotência. Ele sentiu o mundo ruir ao seu redor enquanto assistia Daniel, quem não tinha nada haver com seus machucados, sendo levado preso.
— Isso não está acontecendo, não pode estar acontecendo! — Samanta fungava, levando o celular até a orelha, sua respiração irregular. — Dr. Petterson? Aconteceu algo horrível. — Sua voz falhava enquanto tentava conter o choro. Passou as costas da mão trêmula pelo rosto, limpando as lágrimas enquanto relatava tudo ao advogado da família. — Está bem, a gente se encontra na delegacia. — A mulher encerrou a chamada e rapidamente foi pegar sua bolsa.
Foi então que Lewis foi chamado a realidade e decidiu reagir.
— Ma-mãe… — Sua voz saiu fraca, hesitante, e seu corpo tremia.
— Agora não, Lewis. — Samanta murmurou, revirando a bolsa em busca de algo.
— E-eu preciso contar, é urgente… — Ele insistiu, aflito.
— Lewis, agora não! — Samanta respondeu impaciente.
— Eu sou gay! — Lewis gritou, sua voz ecoando pelo cômodo.
Samanta congelou no lugar, virando-se lentamente para ele.
— O quê você disse? — Sua expressão era de puro choque.
Talvez Lewis fosse muito estúpido.
Quer dizer, por que ele disse isso? Por que não aproveitou a oportunidade e contou a verdade? Por que não revelou tudo pelo que estava passando e que o verdadeiro responsável era Edward?
Talvez seja difícil de entender, mas a explicação era simples: medo. O medo nos cega e, às vezes, nos torna covardes, porque não queremos sofrer retaliações.
Lewis sentia isso, mas não era a única razão.
Quando voltou para o quarto, realmente cogitou jogar tudo para o alto e contar a verdade aos detetives. Se Edward fosse preso, ele não poderia machucar mais ninguém, certo?
Foi isso que Lewis pensou até receber uma ligação de Edward.
Parecia que o monstro podia ler seus pensamentos, porque Edward foi rápido, frio e direto.
Ele apenas disse que, se Lewis abrisse a boca e o fizesse ser pego pela polícia, seus amigos já tinham ordens para pegar sua mãe. E então encerrou a chamada.
Lewis ficou olhando para o celular, perdido. Perdido demais para perceber o que acontecia ao redor.
Então ele apenas se rendeu. Deitou-se na cama, sem alternativas. Iria deixar tudo quieto e esperar que terminasse.
Mas então vieram os gritos de sua mãe. E ele correu para fora do quarto, apenas para se deparar com aquela cena.
Agora, neste momento, tudo o que Lewis conseguia pensar era em salvar Daniel e impedir que ele fosse acusado de algo que definitivamente não fez. E, por isso, ele foi rápido em inventar uma história.
Na verdade, Lewis era bom em inventar histórias.
A prática leva à perfeição, afinal de contas.
— E-eu… ontem… — Ele puxou o ar com força. — Ontem eu saí com uns amigos e conheci um cara… — Seus dedos se apertaram nervosamente. — Eu fui para a casa dele e… e… e-eu fiz sexo com ele. — Sua voz foi diminuindo no final da frase, mas Samanta ouviu perfeitamente.
Sua bolsa caiu no chão, e ela se apoiou na parede, sentindo o mundo girar.
— Vo-você… — Sua voz falhou.
— Me desculpa, mãe. Eu tinha medo de… — Lewis começou a dizer, mas foi interrompido pela súbita explosão da mãe.
— Você tem noção do que acabou de causar?! — O tom de Samanta era uma mistura de fúria e incredulidade. Lewis recuou com choque e medo. — Daniel foi levado para a delegacia como se fosse um criminoso! Isso pode manchar a reputação dele! Pode acabar com a nossa família!
Lewis não conseguiu segurar mais as lágrimas.
— De-desculpa, eu… — Ele soluçou, a culpa esmagando seu peito. — É minha culpa…
— Por que droga você não falou isso antes, Lewis?! — Samanta gritou, exasperada.
O menor soluçou novamente, quase engasgando com as próprias lágrimas. Encolheu-se, apertando as próprias roupas.
— E-eu tinha medo… — murmurou, trêmulo.
Samanta passou as mãos pelos cabelos, respirando fundo. Pegou sua bolsa do chão com pressa.
— A gente conversa depois. Vamos.
Lewis olhou para a mãe, ainda tremendo.
— Você precisa contar a verdade para a polícia, e não esconda nada, Lewis! — Samanta apontou o dedo para ele, sua expressão demonstrando um nervosismo incontrolável.
Lewis apenas assentiu, sem mais forças para discutir, e seguiu sua mãe para fora.