Era meia-noite.

Samanta havia descido para beber água.

Ao passar pela cozinha, aproveitou para encher um jarro e levá-lo para o quarto.

Samanta subia as escadas sem pressa quando, a apenas dois degraus do topo, parou abruptamente.

Seu cenho franziu em estranhamento.

A porta do quarto de Lewis foi aberta, e Edward saiu de lá.

Ele estava sem camisa, segurando a peça de roupa nas mãos. Sem hesitação, caminhou em direção ao próprio quarto, fechando a porta atrás de si.

Ele não a viu.

Por um momento, Samanta achou a cena curiosa. Mas, logo em seguida, um sorriso surgiu em seus lábios.

Os dois devem ter ficado até tarde conversando.

Esse pensamento deixou Samanta extremamente feliz. Gostava de pensar que Edward e Lewis estavam mais próximos, parecendo irmãos de verdade.

Com esse pensamento tranquilo, ela seguiu para seu quarto e não deu mais importância ao ocorrido.

Isso foi há um mês.

E Samanta não lembra mais dessa noite.

Na verdade, sequer havia prestado atenção. Estava sonolenta, exausta, e sua mente não registrou o momento com clareza.

Mas se tivesse prestado atenção…

Se tivesse observado melhor, teria notado que Edward estava suando.

Teria visto que o zíper de sua calça estava aberto.

E se, movida por um lampejo de curiosidade, tivesse ido até o quarto de Lewis…

Ela teria encontrado o filho jogado no chão.

Sangrando.

Chorando.

Desamparado.

******

— Você está com fome, querido? Vou preparar algo para você comer.

Samanta perguntou assim que entraram em casa, sua voz suave, mas carregada de preocupação.

Lewis parou no meio da escada, segurando-se no corrimão.

— Não… eu só… — Sua voz saiu baixa, quase um sussurro. — Só quero descansar um pouco.

Sem esperar uma resposta, voltou a subir, seus passos arrastados.

Samanta permaneceu parada no mesmo lugar.

Apenas o observando desaparecer no topo da escada. Ela suspirou, entrando na cozinha.

****

Já passava das dezenove horas quando a campainha ecoou pela casa.

Na cozinha, Samanta terminava de colocar a mesa para o jantar. O aroma suave do arroz recém-cozido misturava-se ao cheiro do ensopado que ainda borbulhava na panela sobre o fogão.

Ela ajeitou os pratos com cuidado, alinhando os talheres e ajustando a disposição das tigelas. Era um hábito que mantinha sem perceber, uma tentativa de trazer ordem ao dia após um longo dia. A chegada inesperada de alguém àquela hora, no entanto, quebrou seu foco.

Ela franziu o cenho, surpresa. Não esperava visitas.

Passou a mão rapidamente no avental para secá-la e caminhou até a porta. Antes de girar a maçaneta, lançou um olhar rápido para o relógio na parede. Daniel ainda não havia chegado do trabalho. Será que era ele? Mas ele nunca tocava a campainha, sempre usava as chaves.

Com um leve aperto no peito, abriu a porta. O que viu do outro lado fez seu estômago se revirar.

Dois detetives estavam parados ali, suas expressões sérias e impassíveis. O homem alto, de feições rígidas e um olhar atento que varreu cada detalhe da entrada da casa. Era o detetive Jack. Ao lado dele, uma mulher de cabelo escuro preso em um coque impecável, vestindo um sobretudo bem alinhado, segurava um pequeno bloco de anotações. Era a detetive Parker. Havia algo na postura dos dois que fez o coração de Samanta bater mais forte.

Samanta achou que não voltaria a vê-los, então tê-los na frente de sua casa a deixava extremamente ansiosa.

— Boa noite, senhorita Smith. — A detetive foi a primeira a se pronunciar, sua voz calma, mas carregada de firmeza.

Samanta piscou algumas vezes, tentando entender o que estava acontecendo.

— Boa noite… pois não? — Sua voz saiu hesitante.

O homem ao lado da detetive observava-a com atenção, como se tentasse captar cada nuance de sua reação.

— O senhor Smith está em casa? — a detetive prosseguiu, sem rodeios.

Samanta sentiu um arrepio percorrer sua espinha.

— Não, ele ainda não chegou do trabalho. — Respondeu com cautela, um pressentimento ruim se instalando em seu peito. — Algum problema? Do que se trata?

A detetive trocou um olhar rápido com seu parceiro antes de voltar a encarar Samanta.

— Precisamos falar com ele. Mas antes disso, gostaríamos de conversar um pouco com a senhora. Podemos entrar?

Samanta hesitou por um breve instante. Seu olhar foi da mulher para o homem ao lado dela, analisando a seriedade de suas feições. Eles não pareciam estar ali por um motivo trivial, principalmente depois do que foi o primeiro encontro deles. O desconforto dentro dela crescia, e sua mente começou a procurar respostas que ainda não tinha.

Engoliu em seco antes de dar um passo para o lado, abrindo caminho para que os detetives entrassem.

— Claro… entrem. — Sua voz soou um pouco mais fraca do que gostaria.

Os dois passaram pela porta e Samanta fechou-a atrás deles, sentindo o peso do momento se instalar na casa.

— O que aconteceu? — perguntou, cruzando os braços de maneira instintiva.

A detetive deu uma olhada ao redor da sala antes de responder.

— Lewis se encontra?

Samanta franziu o cenho, hesitando por um instante.

— Está no quarto.

O detetive ao lado da mulher manteve-se em silêncio, apenas observando atentamente suas reações.

— Podemos conversar em particular? — a detetive pediu, seu tom sugerindo que o assunto era delicado.

Isso apenas aumentou a inquietação de Samanta. O que eles tinham para dizer que não podia ser dito com Lewis por perto? Seu olhar oscilou entre os dois policiais, tentando decifrar algo em suas expressões, mas tudo o que encontrou foi neutralidade profissional.

Engolindo em seco, ela respirou fundo e os guiou até a sala de estar, onde a luz amarelada dos abajures criava um contraste suave com a atmosfera tensa que agora preenchia o ambiente.

— Por favor, sentem-se. — Ela indicou um sofá para os detetives, e sentou-se no outro, frente aos dois.

A detetive agradeceu com um breve aceno e se acomodou na ponta do sofá, enquanto seu parceiro permaneceu de pé, como se preferisse observar a cena de outro ângulo.

— Vocês… gostariam de alguma coisa para beber?

A detetive trocou um olhar breve com o colega antes de responder:

— Água está bom.

Samanta assentiu e caminhou até a cozinha, tentando ignorar a estranha sensação de que, de alguma forma, aquilo estava prestes a piorar.

Com as mãos levemente trêmulas, pegou dois copos e encheu com água, respirando fundo antes de retornar à sala. Os detetives já estavam sentados no sofá, a postura ereta, aguardando. Ela entregou os copos e sentou-se em frente a eles, mantendo as mãos sobre o colo, apertando os próprios dedos com força.

A mulher foi direta:

— A senhora sabia que Lewis já teve um incidente parecido na escola?

Samanta piscou algumas vezes, confusa com a pergunta.

— Não… Como assim? Que incidente? — Sua voz saiu vacilante, e ela se remexeu na poltrona, ajeitando a postura enquanto tentava entender do que estavam falando.

A detetive manteve os olhos fixos nela, como se analisasse cada mínima reação.

— Um de seus colegas contou já ter visto sangue nas calças de Lewis há mais ou menos um mês. Você tem conhecimento disso?

O mundo de Samanta pareceu balançar.

— N-não… — Sua voz falhou, e ela sentiu o estômago revirar. — Eu não sabia disso.

Seu peito subia e descia em respirações irregulares. Os olhos dela ficaram vidrados por alguns segundos, absorvendo aquela informação, até que sua mão foi automaticamente até os cabelos, puxando-os em um gesto de frustração e angústia.

— Meu Deus… — murmurou, a mente girando em um turbilhão de perguntas sem resposta.

A detetive apenas assentiu, observando-a com atenção. Samanta parecia genuinamente surpresa, o que reforçava a suspeita de que ela não sabia o que estava acontecendo com o filho.

Na verdade, nem mesmo os detetives sabiam exatamente, mas as peças começavam a se encaixar de forma preocupante.

Mais cedo, ao saírem do colégio onde foram chamados por causa de Lewis, a dupla foi abordada por dois alunos: Alex e Nick. Ambos pareciam extremamente preocupados com o colega e decidiram que já não podiam mais ficar calados.

Alex relatou que, há cerca de um mês, viu sangue nas calças de Lewis e o ajudou a cobrir, achando na época que não era nada demais — talvez alguma doença ou um pequeno acidente que o amigo não queria comentar. Mas agora, com os acontecimentos recentes e o estado debilitado em que Lewis foi encontrado, eles tinham certeza de que havia algo muito errado acontecendo.

Nick acrescentou que não era incomum ver Lewis machucado, aparecendo na escola com hematomas ou ferimentos discretos.

— Isso já acontece há algum tempo — Alex reforçou, sua voz carregada de preocupação.

Diante dessas informações, os detetives começaram a considerar seriamente a possibilidade de que Lewis estivesse sofrendo abusos. A falta de uma denúncia por parte do garoto apenas fortalecia a teoria de que o agressor poderia ser alguém próximo ou conhecido, alguém de quem ele tinha medo ou vergonha de falar.

Agora, além de Samanta, eles precisavam conversar com outra pessoa: Daniel Stewart, o padrasto de Lewis.

Antes, porém, haviam ido atrás de outro nome na lista: Edward, o meio-irmão do garoto.

A visita a Edward, no entanto, não trouxe muitas respostas.

O adolescente se mostrou despreocupado, alheio ao peso das perguntas que lhe faziam.

— O que você fez ontem depois da escola? — perguntaram.

— Fui pra casa de um amigo — Edward respondeu com simplicidade, sem esboçar qualquer sinal de nervosismo.

Os detetives ligaram para o tal amigo, que confirmou a história.

Mas algo na frieza de Edward os incomodou.

Ele respondia a tudo sem hesitação, sem tropeçar nas palavras, sem demonstrar qualquer emoção — como se nada daquilo o afetasse.

Se havia algum segredo ali, ele estava bem enterrado.

Agora, sentados na sala de Samanta, os detetives se preparavam para o próximo passo.

— Precisamos falar com Daniel — disse o homem ao lado da detetive, rompendo o silêncio.

Samanta, ainda tentando processar tudo o que havia acabado de ouvir, sentiu um arrepio gelado na espinha.

O que mais estavam escondendo dela?

E, principalmente…

O que, exatamente, estava acontecendo com Lewis?