Lewis chegou em casa por volta das quatro da tarde. Seus pés doíam tanto que mal conseguia ficar de pé, suas costas pareciam prestes a se quebrar, e cada respiração lhe lembrava do cansaço acumulado. O uniforme estava sujo e úmido, colando-se desconfortavelmente à sua pele.
Ao abrir a porta, encontrou Edward largado no sofá, com os pés sobre a mesinha de centro, assistindo a uma partida de basquete com expressão indiferente.
Lewis sentiu o coração acelerar e desviou o olhar rapidamente, subindo as escadas quase correndo. Sabia que, se Edward ainda estivesse de mau humor, qualquer movimento errado poderia desencadear uma agressão.
No quarto, ele deixou a mochila cair no chão com um baque surdo, mas não ousou descansar. Pegou uma toalha e seguiu diretamente para o banheiro. Trancou a porta com firmeza e apoiou as mãos na pia por alguns segundos, olhando seu reflexo no espelho.
Seus olhos estavam vermelhos, fundos, e uma marca arroxeada surgia de forma nada discreta na sua bochecha esquerda.
Ele desviou o olhar, incapaz de se encarar por mais tempo.
Sem pensar muito, ele tirou a roupa, colocou a calça sob a torneira aberta e esfregou com força. A sujeira parecia teimar em sair, mas ele não podia desistir — aquele era o único uniforme que tinha.
Depois de algum tempo, finalmente colocou a calça para secar e entrou no chuveiro. A água quente escorria por seu corpo magro, levando embora parte da sujeira, mas nenhum dos medos ou cicatrizes.
Ele não teve tempo para chorar. As lágrimas estavam lá, presas na garganta, mas havia muito para fazer, e ele não podia se dar ao luxo de perder tempo.
Após se lavar rapidamente, saiu do banheiro com a toalha enrolada no corpo, abraçando-se como se pudesse se proteger de tudo.
No quarto, trancou a porta e girou a chave duas vezes para se certificar. Vestiu roupas confortáveis, respirou fundo e, mesmo sentindo o corpo fraco, desceu para preparar o jantar.
A cozinha estava silenciosa, apenas o som dos utensílios sendo manuseados por Lewis preenchia o espaço. Ele picava ingredientes com precisão, focado em sua tarefa. Estava preparando lasanha de carne, um dos pratos preferidos de sua mãe. Sabia que, pelo menos à mesa, poderia aproveitar alguns momentos de calmaria.
Enquanto a lasanha assava no forno, Lewis começou a arrumar a cozinha. Não gostava de deixar a bagunça acumular, sabia que Edward prestava atenção a cada detalhe, e qualquer pequeno erro poderia ser motivo para outro insulto… ou algo pior.
— Me dê água.
A voz firme e grave de Edward ecoou pela cozinha, fazendo Lewis congelar no lugar por um segundo. Ele se virou lentamente, com os olhos baixos.
— Sim… — Sua voz saiu quase como um sussurro.
Ele pegou um copo, encheu-o com água gelada e caminhou até Edward com as mãos tremendo levemente. O homem pegou o copo sem agradecê-lo, os olhos verdes focados em Lewis como se procurassem algo.
— O que você está cozinhando? — Edward perguntou de repente, a voz calma, mas carregada de uma autoridade velada.
— Lasanha de carne… — Lewis respondeu baixo, o olhar ainda preso ao chão.
Edward permaneceu parado por mais alguns segundos, observando-o como um predador analisando sua presa.
Por fim, colocou o copo no balcão com um baque surdo e saiu da cozinha sem dizer mais nada.
Lewis soltou o ar preso nos pulmões e deixou que seus ombros caíssem levemente. Terminou de cozinhar em silêncio absoluto, concentrando-se em cada movimento para evitar qualquer erro.
Quando tudo estava pronto, ele começou a arrumar a mesa com cuidado. O som da porta de entrada indicou a chegada de seus pais, e o alívio foi imediato. Sua mãe, Samanta, entrou primeiro, sorrindo calorosamente para ele, seguida por seu padrasto, Daniel, que parecia tão cansado quanto Lewis.
— Rapazes, tudo bem? — Daniel perguntou, sua voz grave e amigável ecoando pelo ambiente.
Samanta aproximou-se de Lewis, segurando seu rosto entre as mãos e depositando um beijo carinhoso em sua testa. Ela sorriu para Edward, mas ele apenas a ignorou, recusando qualquer demonstração de afeto.
— O que é isso, querido? — Samanta tocou suavemente a bochecha do filho, onde uma leve mancha arroxeada ainda era visível.
Lewis recuou instintivamente, desviando o olhar.
— Nada, mãe. Eu bati na porta do banheiro. — Sua voz soou convincente o suficiente para que Samanta apenas suspirasse e dissesse para ele ter mais cuidado.
Ela observou o filho por mais alguns segundos antes de finalmente sorrir e mudar de assunto.
— Isso está cheirando muito bem! O que preparou hoje, meu amor? — perguntou, puxando Lewis para um abraço rápido.
— Lasanha de carne, mãe. — Lewis sorriu, ainda que seu sorriso fosse tímido e contido.
— Oh, que delícia! Vou me trocar e já volto para jantar. — Samanta puxou Daniel pelo braço, e os dois subiram as escadas, conversando sobre algo trivial.
Lewis observou-os desaparecer no andar superior e soltou um suspiro silencioso. A presença deles era um escudo temporário, uma pausa entre as tempestades que frequentemente surgiam quando ele e Edward ficavam sozinhos.
Edward continuava sentado no sofá, o celular em mãos, os dedos deslizando pela tela enquanto uma expressão de tédio tomava seu rosto. Lewis foi até a mesa, verificou se tudo estava perfeito, e ocupou seu lugar. O silêncio que se instalou entre os dois era pesado, quase palpável.
Quando Samanta e Daniel voltaram, ambos vestiam roupas mais confortáveis. Samanta parecia animada, como sempre, e Daniel trazia consigo uma expressão tranquila.
— Vamos jantar? — Samanta sorriu, sentando-se à mesa.
Edward finalmente levantou-se do sofá e caminhou lentamente até a mesa. Sentou-se à frente de Lewis, enquanto Samanta e Daniel ocupavam os lugares opostos.
Durante o jantar, Samanta fez questão de elogiar a lasanha repetidas vezes, falando sobre como estava deliciosa. Daniel concordou com um sorriso, e Edward apenas se manteve em silêncio, como sempre.
Lewis agradeceu baixinho, tentando comer devagar. Ele preferiu manter a cabeça baixa e focar na comida. De vez enquanto Edward olhava pra ele de forma provocativa e Lewis se esforçava em ignorar.
Depois do jantar, Lewis ajudou a mãe a recolher os pratos e limpar a mesa. Samanta insistiu para que ele subisse e descansasse, mas ele recusou educadamente, alegando que precisava terminar algumas coisas na cozinha.
Enquanto esfregava os pratos, Lewis ouviu os passos de Edward subindo as escadas. Seu corpo relaxou um pouco, mas ele sabia que a tranquilidade nunca durava muito tempo.
Mais tarde, já no quarto, Lewis trancou a porta mais uma vez e deitou-se na cama, olhando para o teto escuro. Ele podia ouvir vozes abafadas vindas do quarto de seus pais e o som distante da TV ligada.
Fechou os olhos, tentando afastar os pensamentos sombrios que insistiam em invadir sua mente. O silêncio era tão profundo que quase podia ouvir os batimentos do próprio coração.
Seus dias eram uma constante sucessão de medo, silêncio e sobrevivência. Mas, por enquanto, ele ainda estava ali — respirando, vivo. E isso era o suficiente… pelo menos por agora.